domingo, 31 de março de 2013

Tire você a conclusão...

“João nasceu sem chorar, levou palmada do doutor até a mãe ficar com dó. Parecia que João já veio ao mundo querendo chorar de dor, mas não queria incomodar. João comia todos os vegetais e legumes do prato. João cresceu forte e saudável, com o estômago verde e os olhos azedos pelo espinafre que engoliu ao longo da vida. João quando aprendeu a rimar, odiava o próprio nome. Odiava os colegas na hora da chamada. João, pé de feijão. João passou a odiar os contos de fada. João via girafas no céu, até que alguém disse que nuvem era água vaporizada. E João nunca mais viu uma girava no céu, por medo de contrariar. João odiava matemática, mas estudou e levou um dez por medo de reprovar. João fechava a janela do quarto quando os passarinhos acordavam, porque ele gostava de dormir sempre uma hora a mais, por medo de não conseguir assistir a aula no dia seguinte. João colocava o fone de ouvido baixo, por medo de prejudicar a audição. João reclamava quando o chiclete perdia o açúcar, e nunca passou mais de 5 minutos mascando porque detestava dentista, por medo de apodrecer os dentes. João enricou, por medo de não poder mais reclamar de nada. O João, que odiava matemática, virou engenheiro. João detestava azul, mas comprava sempre da mesma cor, por medo de mudar. João odiava a mulher que dava troco em balas, mas aceitava, por medo de ter que esperar um pouco mais na fila. João jogava as balas fora, não dava pra criança pobre nenhuma, porque não queria alimentar a vadiagem. João odiava o calor, e mandou comprar um ar-condicionado que sugava o seu nariz, porque não queria suar. João nunca montou caras no suporte do ventilador, nem ouviu como sua voz ficaria engraçada se ele tivesse gritado nas hélices. João reclamava do barulho de tábuas rangendo, e nunca conseguiu escutar o som dos netos quando eles começaram a andar. E agora o João era Seu João, um velho que nunca precisou de óculos porque nunca quis saber de ler no escuro, um homem que escutava qualquer coisa, mas preferia ser surdo a ter que ouvir todo aquele silêncio proposital, um homem que comeu todos os vegetais do prato, que não tinha uma única cárie, que era engenheiro e odiava matemática. João morreu dormindo. Por medo de incomodar.”
— Cinzentos

sábado, 9 de março de 2013

A águia e a galinha




Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo em sua casa.

Conseguiu pegar um filhote de águia.
Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Cima milho e ração própria para galinhas. Embora a águia foi a rainha de todos os pássaros.
Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista.
Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
-"Esse pássaro não é galinha. É uma águia."
-"De fato" - disse o camponês. "É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais como uma águia."
Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase 3 metros de extensão.
-"Não" - retrucou o naturalista. "Ela é e sempre será uma águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar alturas."
"Não, não." Insistiu o camponês. "Ela virou galinha e jamais voará como águia."
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:
"Já que você de fato é uma águia, e pertence ao céu e não a terra, então abra sua asase voe!"
A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para juntos delas.
-"Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha."
-"Não" - tornou-se a insistir o naturalista.
-"Ela é uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã."
No dia seguinte o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurrou-lhe:
-"Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!"
Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou e foi para junto delas.
O camponês sorriu e voltou a dizer:
-"Eu lhe havia dito, ela virou uma galinha!"
-Não!". respondeu firmemente o naturalista.
-"Ela é uma águia, possuirá sempre um coração de águia." - "Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar."
No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram bem cedo. Pegara, a águia, levaram para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha. O sol renascente dourava os picos das montanhas. O naturalista ergue a águia para o alto e ordenou-lhe:
-"Águia, já que você é uma águia, e pertence ao céu e não a terra abra suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse uma nova vida. Mas não voou. Enquanto o naturalista segurou-se firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.
Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou e ergueu-se, soberana sobre si mesma.
E começou a voar e a voar para o alto, a voar cada vez mais para o alto. Voou... voou... até confundir-se com o azul do firmamento...

"Encontramos pessoas que nos fizeram pensar como galinhas. E muitos de nós ainda acham que nós somos efetivamente galinhas. Mas nós somos águias. Por isso, abramos as asas e voemos. Voemos como as águias. Jamais nos contentemos com os grãos que nos jogaram aos pés para ciscar."
A escolha é nossa.

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